Irmãos e irmãs, no tempo de Jesus e,
segundo os evangelistas, muitos tinham opiniões sobre o ser e agir de
Jesus, ao ponto de confundi-Lo com importantes personagens da história
da Salvação (cf. Mt 14,1-2; Mc 9,14-16; Lc 9,7-9). Mas quem era o
verdadeiro Jesus que lhes falava e manifestava, também por atos e até
mesmo no silêncio, o amor de Deus que redime?
Esta questão tinha e continua a ter
grande importância, por isso o próprio Senhor pergunta aos doze
apóstolos, após terem orado por longo tempo, quem era aquele Homem que
os chamou, orou com eles, partilhou a vida e as palavras, realizou
grandes sinais diante da vista de todos: “E vós, quem dizeis que eu
sou?” (Lc 9,20).
Como porta-voz dos demais, Pedro
respondeu com palavras inspiradas: “O Cristo de Deus” (v. 20). Mas será
que ele tinha noção do que significaria, no mistério de Jesus, aquelas
palavras? Uma leitura comparativa dos Evangelhos sinópticos, inclusive
em Mt 16, 13-20, percebe-se que, naquele momento, em Cesaréia de Filipe,
eles ainda não seriam capazes de conceberem a relação de Jesus como o
Messias e, ao mesmo tempo, o realizador da profecia do Isaías.
Será preciso um Calvário e a releitura
dos acontecimentos, em comunidade, guiada pelo Espírito Santo (cf. Jo
14,26) para que a Igreja, num todo, identificasse Jesus Cristo como
Servo Sofredor sem fatalismo: “Era o mais desprezado e abandonado de
todos, homem do sofrimento, experimentado na dor, indivíduo de quem a
gente desvia o olhar, repelente, dele nem tomamos conhecimento” (Isaías
53, 3). Mas o Cristo é também o Mestre dos mestres que, em sua pedagogia
divina, foi revelando a verdade, a qual, aos poucos, os doze e a
Igreja, ao longo do tempo, foi e continua a ser chamada a aceitar, para
que a interpretação do Mistério de Cristo não tenha o ruído do
triunfalismo.
“É necessário o Filho do Homem sofrer
muito e ser rejeitado pelos anciãos, sumos sacerdotes e escribas, ser
morto e, no terceiro dia, ressuscitar” (Lc 9, 22). Até parece que Jesus
estava com o trecho de Isaías, acima citado, frente aos seus olhos. Mas,
muito mais do que isto, todo o Antigo Testamento estava em seu coração
como a história de toda a humanidade, a qual continua necessitada de um
único messias que corresponda e supere as esperanças dos povos. Por
isso, alerta o magistério da Igreja, instruída pelo Espírito de Cristo:
“Numerosos judeus, e até certos pagãos que compartilhavam a esperança
deles, reconheceram em Jesus os traços fundamentais do “Filho de Davi”
messiânico, prometido por Deus a Israel.
Jesus aceitou o título de Messias [Cristo
em grego] ao qual tinha direito, mas com reserva, pois este era
entendido por uma parte de seus contemporâneos segundo uma concepção
demasiadamente humana, essencialmente política” (CIC, nº 439). Por isso
as palavras do primeiro Papa, também representa o reto ensinamento da
Igreja de Cristo, que pelo seu Catecismo, exprime a fé n’Aquele que
ressuscitou, mas, antes, sofreu por cada um de nós e por todos a Sua
Paixão e Morte. Assim, a Fé Pascal (Morte e ressurreição) precisa também
suscitar a nossa resposta diária ao Cristo que continua a nos
questionar: “E você que é cristão, quem é o Cristo que você segue,
principalmente quando a vida lhe propõem ou impõem um Calvário? Quando
quereríamos ser tratado com se estivéssemos ainda em Cesaréia,
ignorantes em muitas coisas? Talvez, até estejamos nesta etapa, na qual o
conhecimento que temos da Palavra de Deus ainda paire abstrato sobre a
nossa existência e ações. Por isso, Cristo, como fez com os doze
continua a nos propor, nunca impor, a vida de oração comunitária e
apostólica (cf. Lc 9, 18) para que, mesmo sem entendermos muitas coisas,
possamos ainda nos unir ao mistério do Cristo Pascal.
D’Ele não vem o sofrimento nem a
provação, mas a certeza de que nada que passamos, passa ao lado do Seu
coração cheio de compaixão e verdade. Ele não é indiferente a ninguém
nem às razões das nossas lutas e lágrimas.
De Cesaréia de Filipe ao Calvário, os
apóstolos precisaram da paciência e sabedoria do Mestre e Bom Pastor.
Também nós podemos ter a certeza de que Ele não mudou a Sua pedagogia, a
qual transforma o tempo num elemento imprescindível para o nosso
amadurecimento como discípulos e missionários. Agora, ninguém pode ceder
aos messianismos presentes, que prometem um céu aqui na terra, ou seja,
não se pode dispensar do seguimento e união ao verdadeiro Jesus Cristo,
cabeça da Igreja, Aquele que por amor aceitou «sofrer muito» e
ressuscitar, no terceiro dia, para nos comunicar o Espírito Santo.
Ele não está obrigado a poupar ninguém do
mistério do sofrimento humano neste mundo passageiro. Por isso também,
Ele continua conosco como consolo e modelo Supremo na árdua missão que
conferiu à Sua Igreja (cada um a seu modo), a partir do Papa e aos
sucessores dos apóstolos: «Ensinai-lhes a observar tudo o que vos tenho
ordenado. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos»
(Mt 28, 20).
Padre Fernando Santamaria
Comunidade Canção Nova