Geralmente, quando ouvimos falar em jejum
e abstinência, o primeiro sentimento que temos não é muito agradável.
Normalmente, o sentimento é o de privação. A primeira ideia que nos vem
à cabeça é ter de abdicar de coisas que nos agradam e, talvez, de
outras que até já nem sabemos viver sem elas, e claro, consideramos isso
muito desagradável. Isso se nos apresenta como um impedimento à
satisfação das nossas necessidades, ou como uma restrição à nossa
liberdade de escolha.
É preciso saber, porém, que o nosso
inimigo (o demônio) não perde nenhuma oportunidade de alimentar-se com
os nossos vãos pensamentos. Pois, em nossas imaginações, desejos e
fantasias, ou seja, o nosso psíquico “olhar” interior, é onde o demônio
encontra munição e facilidades para as suas armadilhas e sugestões. É
urgente vigiar a mente e exercitar a prática de pensamentos virtuosos,
objetivos e realistas.
O resultado disso é que, espiritualmente,
de fato, mata-se de fome o demônio. Sublime maravilha! Nós nos
recusamos a alimentar o inimigo e, como recompensa deste cerrado
combate, ficamos com a alma nutrida pela graça. Esta é a abstinência que
sacia a alma e, com ela, o corpo.
Esse é o profundo e definitivo jejum.
Todos os jejuns e abstinências que a Igreja nos pede são, inicialmente,
apenas jejuns exteriores, do corpo carnal. Porém, sabemos que o homem
não é somente carne; junto com ela coexiste o – ainda desconhecido –
homem interior de cada um.
Na verdade, a abstinência de alimentos
serve como uma espécie de ferramenta para a purificação da alma.
Abstemo-nos dos alimentos carnais para nos fortalecermos espiritualmente
para a abstinência da alma e dos pensamentos. Nós diminuímos a ingestão
de matéria para o corpo e, em contrapartida, o Senhor derrama, na alma,
Suas graças espirituais. Assim, ela se ilumina e fortalece todo o ser.
Como podemos ver, o jejum é considerado
autêntico quando praticado em espírito de entrega. Assim fazendo,
estaremos mais receptivos para receber as bênçãos gratuitas de Deus. Não
devemos fazer do jejum um ato meritório, ou seja, para alcançar os
favores divinos. Isso é mesclar a Boa Nova do Evangelho com o formalismo
do Judaísmo antigo; até porque jejuar e orar, quando imbuídos de um
espírito de justificação própria, é uma abominação aos olhos de Deus.
A essência do jejum, retomada por Jesus – o vinho e o pano novos -, está em Isaías 58,6: “Porventura
não é este o jejum que escolhi, que soltes as ligaduras da impiedade,
desfaças as ataduras das servidão, deixes livres os oprimidos e
despedaces todo jugo?”
Oxalá, transformados pelo poder da
Palavra de Jesus, sejamos realmente odres novos para receber o vinho
novo e o pano novo, para receber Aquele que vem para remendar a nossa
vida cheia de rasgões e furos feitos pelo nosso inimigo que anda à solta
como “o leão que ruge procurando a quem devorar”.
Padre Bantu Mendonça
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