quinta-feira, 26 de julho de 2012

Teólogo explica o Instrumentum Laboris

O Papa Bento XVI convocou a 13ª Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos para o período de 7 a 28 de outubro, em Roma. No final de junho, o Vaticano publicou, o Instrumentum Laboris, documento de trabalho sobre o Sínodo. A reportagem do jornal arquidiocesano  O São Paulo conversou com o teólogo Francisco Catão, professor da Escola Dominicana de Teologia e do Instituto Teológico Pio XI, sobre a importância do documento e como ele se apresenta.

O SÃO PAULO – A Secretaria do Sínodo divulgou no final de junho o documento de trabalho da próxima Assembleia Geral do Sínodo, convocado para o próximo dia 7 de outubro. Qual a significação desse documento?

Professor Francisco Catão –
Trata-se da 13ª Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, organismo da administração romana, criado no Vaticano II, para exprimir a participação dos bispos no governo da Igreja Católica. É a colegialidade, reconhecida e proclamada pelo Vaticano II. No seu regulamento, o Sínodo dos Bispos se reúne por convocação do Papa, regular ou extraordinariamente, em assembleias. O Papa indica o tema geral a ser discutido. A Secretaria do Sínodo faz uma ampla consulta a toda a Igreja, a partir da qual elabora o documento de trabalho, que contém além dos pontos a serem tratados, a linha geral que se depreende das expectativas de toda a Igreja.

O SÃO PAULO – O que o senhor acha do tema da próxima assembleia?

Professor Catão –
Como sabemos, o tema indicado por Bento XVI é “A nova evangelização e a transmissão da fé católica”. O conceito de nova evangelização perpassa o ensinamento de João Paulo II e foi assumido por Bento XVI como objeto de importante aprofundamento teológico: exprime o papel preponderante de “A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja”, tema da 12ª Assembleia por ele convocada, em 2008. A Exortação Apostólica que tratou das proposições votadas nesta assembleia, a Verbum Domini, em 2010, abriu o caminho para se pensar a missão da Igreja no mundo à luz do testemunho da Palavra de Deus, Jesus Cristo, na sua vida e no seu ministério.

Essa forma renovada de encarar a Igreja, herdada do Vaticano II, remonta ao tempo dos apóstolos e nos leva a reencetar sua grande missão de evangelizar todas as criaturas, para lhes transmitir a fé. Daí a profundidade teológica do conceito de “nova evangelização” e sua amplidão, que alcança, de fato, toda a vida e a ação da comunidade cristã no mundo, chamando-a a ser a comunidade dos discípulos e missionários de Jesus, como já se proclamou em Aparecida.

O SÃO PAULO – Que se pode esperar da próxima assembleia sinodal?

Professor Catão
– A tarefa dos padres sinodais é de propor ao Papa medidas que lhes pareçam apropriadas a assegurar a contínua renovação da Igreja visada pelo Vaticano II.

Mais do que a reforma de alguns aspectos particulares da vida da Igreja e de sua estrutura, o concílio iniciou, há cinquenta anos, um processo de renovação, ou aggiornamento da comunidade católica, em face dos desafios das divisões existentes entre os cristãos, de modo geral, e da vertiginosa evolução cultural do mundo secular.

As assembleias sinodais, ordinárias e extraordinárias, trataram até hoje de pontos específicos da vida da Igreja. As duas assembleias convocadas por Bento XVI, porém, tinham e têm a ambição de retomar a perspectiva de conjunto do Vaticano II e tratar da renovação da Igreja a partir de sua fonte, que é a Palavra de Deus, que nos comunica a vida, ou o Espírito de Deus. O sínodo vai, por isso, se debruçar sobre a missão da Igreja no seu conjunto, em vista da realização do projeto de João 23, de instaurar a Igreja sobre um novo Pentecostes.

O SÃO PAULO – Nessa perspectiva, que se pode dizer do documento de trabalho?

Professor Catão –
A consulta feita à Igreja, consubstanciada nos Lineamenta ou roteiro de consulta, já alertava para as grandes orientações acenadas pelo Papa. O documento de trabalho confirma o eco positivo que o pontificado atual encontra na Igreja, o que é, certamente, dom do Espírito. Esse acolhimento positivo ressalta nos quatro capítulos de que se compõe o documento de trabalho, é confirmado na introdução e reforça as considerações finais, da conclusão.

O primeiro capítulo fornece a base e a finalidade da evangelização: levar todos os humanos, independentemente das divisões de raça, cultura, nacionalidade ou prática religiosa, a reconhecer em Jesus o salvador da humanidade e a acolhê-lo, numa relação pessoal de gratidão e de amizade. O segundo capítulo trata da nova evangelização propriamente dita, fundada no anúncio e na consolidação da relação pessoal com Jesus e com Deus. O terceiro capítulo, fundamental, lembra que essa relação pessoal se funda na fé, entendida não somente como um conjunto de verdades a professar, mas, radicalmente, como a adesão profunda de nosso coração a Deus, que comporta o acolhimento de sua Palavra.

Bento XVI, com o apoio de toda a Igreja, está convencido de que é necessário e urgente restaurar a fé como adesão pessoal a Deus, por Jesus, no Espírito. Por isso, faz coincidir o sínodo sobre a evangelização com o cinquentenário do Vaticano 2º, os vinte anos da publicação do Catecismo da Igreja Católica e o Ano da Fé, que teve por bem promulgar, de outubro 2012 a novembro 2013.

Finalmente, o quarto capítulo reúne uma série de sugestões práticas feitas pelas instâncias consultadas, mostrando de que forma, na sua diversidade, reclamam ou realizam a renovação que brota da fidelidade ao primado da Palavra na evangelização.

O SÃO PAULO – Como professor de teologia, o senhor vê algum ponto a ser destacado?

Professor Catão –
Como cristão que vive no mundo, sem responsabilidade pastoral além do exercício da função de teólogo, chama-me atenção dois aspectos do documento de trabalho. Em primeiro lugar, o referencial da nova evangelização, que não é, em primeiro lugar, a instrução sobre a doutrina da fé, mas a experiência cristã: experiência de Jesus, feita por Jesus na sua relação com o Pai e comunicada por Jesus ao nos enviar o seu Espírito. A palavra experiência aparece setenta vezes no documento. Está praticamente sempre presente. Pode ser considerado o objeto primeiro da nova evangelização: comunicar a todos os homens o acesso a Deus, como diz, aliás, a Verbum Domini, que promulga o sínodo de 2008.

Além disso, destacaria a natural preocupação com a renovação da linguagem da fé, a necessidade de encontrarmos a forma mais adequada de tornar acessível a todos os humanos a experiência de Deus vivida e anunciada por Jesus, a que se referem as muitas passagens do documento de trabalho.

Nesse sentido, vale lembrar a proposta do Congresso dos Leigos da Arquidiocese, em 2010, assumida pela Associação Nova Evangelização (ANEV), que está inaugurando um site específico para se tornar um verdadeiro laboratório da linguagem da fé. Através desse site, a ANEV oferece a todos os interessados a possibilidade de colaborar, discutindo a linguagem da fé, nessa tarefa primordial da nova evangelização.

O site procurará não só divulgar, mas acompanhar o mais perto possível os desenvolvimentos da 13ª Assembleia do Sínodo e discutir as questões que se apresentem nessa área específica. Nós os convidamos a visitar-nos: www.linguagemdafe.com.br.

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