A Igreja reza pedindo que Deus
redobre, “multiplique” Seu amor para conosco, a fim de que, conduzidos
por Ele, usemos de tal modo os bens que passam, podendo abraçar os que
não passam. A administração dos bens sempre foi um desafio para a
humanidade, tanto que os sistemas econômicos, a partir de visões
diferentes, alternam-se ou se complementam numa busca incansável das
respostas adequadas às necessidades humanas. No Evangelho, Jesus se
ocupa, em Seus ensinamentos, parábolas ou milagres, do tema dos bens a serem cuidados pela humanidade.
O
fato da multiplicação de pães e peixes, milagre realizado por Jesus e
narrado pelos quatro evangelistas, é carregado de ensinamentos, fonte
inesgotável para a vida cristã em todos os tempos. São João no-lo
descreve com grande riqueza de detalhes (Jo 6,1-15), reportando, no
mesmo capítulo em que o descreve como um dos “sinais”, o discurso a
respeito do Pão da Vida, no qual o Senhor confronta Seus próprios
discípulos com a escolha decisiva que também orientará a vida de todos
os homens e mulheres que viessem a acolher a Boa Notícia do Evangelho no
correr dos séculos. De forma muito clara, abre ainda as mentes e os
corações para o milagre cotidiano, com o qual o Senhor se faz presente
na Eucaristia.
Dentre tantas riquezas da multiplicação de pães,
podemos voltar os olhos para aquele menino que ofereceu a
“contrapartida” para que o Senhor realizasse o milagre. As crianças nem
eram contadas, tanto que o número de cinco mil homens pode ser
multiplicado, pelas mulheres e crianças certamente presentes ao episódio
da multiplicação. Jesus acolhe quem nem mesmo vale para a sociedade de
seu tempo, recolhe o pouco que pode ser oferecido e multiplica. Desde
cedo, o Cristianismo aprendeu com o seu Senhor e Mestre a verdade da
partilha, ponto de partida para a intervenção da graça que,
efetivamente, multiplica o que se pode oferecer, do menor ao maior, para
chegar a todos que podem entrar, cada dia numa igreja, ter os olhos
voltados para o altar e ali aprenderem a lição perene da multiplicação.
Muitas vezes, cantamos “sabes,
Senhor, o que temos é tão pouco para dar, mas este pouco nós queremos
com os irmãos compartilhar”. As desculpas são muitas, pois um não possui
nem mesmo moedas, outro não tem ideias, aquele não tem coragem e a
muitos falta a criatividade ou a iniciativa. O apelo suscitado pelo
Evangelho é a uma mudança que se pode chamar “cultural”. A cultura
cristã tem a marca do “dar” e do “receber”, capacidade de oferecer o que
se tem de melhor, mesmo que sejam os pães e os peixes do menino, as
duas moedas da viúva pobre, o óleo perfumado da mulher pecadora ou a
vida daqueles doze homens chamados por Jesus para começar tudo. Lições
de Economia, Administração, Matemática! Voltemos à velha “tabuada”.
Tabuada
de um! Para Deus vale o que você tem. Uma é a vida a ser oferecida. A
chance que lhe é oferecida é irrepetível. Você pode gastá-la para ser
feliz, olhando para o Senhor que só sabe amar e se oferecer neste amor
infinito.
Houve um homem, bem conhecido meu, aliás - meu pai -, discreto e silencioso, tímido, mas do qual soubemos, após sua morte, ter dado bolsas de estudo a muitas pessoas pobres. O que fez com a mão direita, nem a esquerda soube, mas Deus fez aparecer os testemunhos quando já tinha sido chamado para junto d'Ele.
Houve um homem, bem conhecido meu, aliás - meu pai -, discreto e silencioso, tímido, mas do qual soubemos, após sua morte, ter dado bolsas de estudo a muitas pessoas pobres. O que fez com a mão direita, nem a esquerda soube, mas Deus fez aparecer os testemunhos quando já tinha sido chamado para junto d'Ele.
Tabuada
de dois! Olhe ao seu redor, pois é sempre possível compartilhar e, ao
mesmo tempo, receber muito dos outros. Pertinho de você existem pessoas
amigas, há ouvidos abertos para escutar e gente que espera uma palavra
que pode ser a sua. Comece o diálogo com a pessoa que se assenta ao seu
lado num transporte coletivo, ou com quem está perto de você numa das
muitas filas a serem enfrentadas. Oferta, escuta, gestos, atenção, bens materiais.
Saiba receber com humildade e simplicidade. Vale a pena lembrar que
bastam dois reunidos em nome de Jesus, que se amem mutuamente, para que
Ele esteja presente.
Tabuada
de cinco! Os dons de Deus são irrevogáveis e infinitamente
desproporcionais às nossas capacidades e, eventualmente, pequenas
ofertas. Basta verificar a quantidade de obras sociais nascidas do
Evangelho no coração da Igreja para ver o quanto os meios pobres, mas
bem administrados, são orvalhados pela graça. Quantos são os filhos sem
nome ou sem genitores conhecidos que foram acolhidos! E a presença no
campo da educação! Escute o que têm a dizer as muitas iniciativas de
caridade. Conheça o que faz a Cáritas Arquidiocesana de Belém (PA), abra
seus olhos para ver que nossa pobreza se faz riqueza, para que o que
tem muito não tenha sobra e o que tem pouco não tenha falta. Onde houver
um cristão de verdade, esteja presente o milagre da multiplicação! Um,
dois, cinco, mil. Uma contabilidade nova! As contas de Deus serão sempre
maiores, porque são do tamanho da eternidade.
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém - PA
Arcebispo de Belém - PA