“Minha filha, fala a todo o mundo da Minha inconcebível misericórdia.
Desejo que a Festa da Misericórdia seja refúgio e abrigo para todas as
almas, especialmente para os pecadores. Neste dia, estão abertas as
entranhas da Minha misericórdia. Derramo todo um mar de graças sobre as
almas que se aproximam da fonte da Minha misericórdia. A alma que se
confessar e comungar alcançará o perdão das culpas e das penas. Nesse
dia, estão abertas todas as comportas divinas, pelas quais fluem as
graças. Que nenhuma alma tenha medo de se aproximar de Mim, ainda que
seus pecados sejam como o escarlate. A Minha misericórdia é tão grande
que, por toda a eternidade, nenhuma mente, nem humana, nem angélica a
aprofundará. Tudo o que existe saiu das entranhas da Minha misericórdia.
Toda alma contemplará em relação a Mim, por toda a eternidade, todo o
Meu amor e a Minha misericórdia. A Festa da Misericórdia saiu das Minhas entranhas.
Desejo que seja celebrada solenemente no primeiro domingo depois da
Páscoa. A humanidade não terá paz enquanto não se voltar à fonte da
Minha misericórdia”.
Sem
dúvida, como você pode notar, trata-se de um trecho relativamente
pequeno, mas de conteúdo muito denso. É próprio de Jesus falar desse
modo. No Evangelho temos inúmeros exemplos de passagens em que Jesus,
em poucas palavras, preenche nossa mente e nosso coração com a sabedoria
do alto. Um bom exemplo disso são as parábolas. Procuremos, então,
compreender passo a passo o sentido profundo dessa palavra de Jesus.
“Desejo que a Festa da Misericórdia seja refúgio e abrigo para todas as almas, especialmente para os pecadores” - Um
olhar atento e cuidadoso para o Diário de Santa Faustina revela a
insistência de Jesus, e até mesmo sua pressa, em que seja aprovada,
difundida e celebrada na Igreja a Festa da Misericórdia. O tema aparece
25 vezes ao longo de todo o texto. Cada um de nós poderá dedicar algum
tempo especial para refletir sobre essas passagens realmente
maravilhosas que revelam a predileção de Jesus por essa Festa. Seguem os
números dos parágrafos que se referem à Festa da Misericórdia, para que
você possa aprofundar seu significado: 49, 74, 88, 206, 280, 299, 300,
341, 420, 458, 463, 505, 570, 699, 715, 742, 796, 1041, 1042, 1059,
1073, 1082, 1109, 1517, 1530.
“Neste
dia, estão abertas as entranhas da Minha misericórdia. Derramo todo um
mar de graças sobre as almas que se aproximam da fonte da Minha
misericórdia” - Ao longo do ano litúrgico, a Igreja celebra
os principais fatos e acontecimentos da vida de Jesus: encarnação,
nascimento, vida pública, morte e ressurreição, ascensão, descida do
Espírito Santo sobre a Igreja etc. A liturgia é, pois, a memória do
mistério de Cristo. Não é apenas uma “recordação” de algo do passado,
mas uma atualização no presente daquilo que Deus realizou num
determinado momento da história da salvação e que continua a realizar em
nossa vida. Isso é o que significa a expressão “memória” na liturgia:
nós revivemos, a cada dia, o mistério da vida de Jesus, com toda a força
e o poder de Deus em nossa história atual. Nesse contexto, também se
insere a celebração da Festa da Misericórdia. Trata-se de uma
atualização, no presente, do momento em que a fonte da Misericórdia
Divina se abre e os raios do amor misericordioso de Deus se derramam
sobre toda a humanidade. Nós revivemos, no momento presente, na história
pessoal de cada um de nós, aquilo que Jesus fez na cruz, ao deixar que a
lança abrisse seu coração, para dele derramar sobre todos nós a graça
infinita da sua misericórdia.
“Que nenhuma alma tenha medo de se aproximar de Mim, ainda que seus pecados sejam como o escarlate” - A
Igreja proclama a misericórdia como o maior atributo, a maior qualidade
de Deus. A encíclica sobre a Misericórdia Divina, do Papa João Paulo
II, começa justamente com essas palavras “Deus é rico em misericórdia”,
retiradas da carta de São Paulo aos Efésios, capítulo 2, verso 4. Para
Deus, de fato, não importam mais os pecados quando a alma se arrepende e
volta para Ele. A parábola do filho pródigo bem revela esse amor do Pai
que esquece o erro do filho: antes mesmo que o filho pudesse se
explicar e pedir desculpas (leia o texto e veja que o filho tinha até
ensaiado as palavras que diria ao pai), o pai o abraça, o beija e manda
preparar uma festa (Lc 15,20ss).
“A Minha misericórdia é tão grande que, por toda a eternidade, nenhuma mente, nem humana, nem angélica a aprofundará” - A
Misericórdia Divina não pode ser compreendida racionalmente, é um
mistério. E o que significa a palavra mistério: aquilo sobre o qual
devemos nos calar. O mistério não é para ser compreendido, mas para ser
vivido. Entre todos os mistérios de Deus, está o de sua infinita
misericórdia por cada um de seus filhos e filhas. A imagem humana que
alguns fazem de Deus é carregada do aspecto da justiça: Deus parece um
ser vingativo e justiceiro. Esse é o “deus”, com d minúsculo, feito à
nossa imagem e semelhança. O Deus de Jesus Cristo é o Deus do amor e da
compaixão, do perdão e da misericórdia. Não se pode compreender esse
mistério, mas podemos fazer a experiência desse amor. Por isso, como eu
costumo dizer, dificilmente alguém poderá falar da misericórdia de Deus
sem antes ter feito a experiência, em sua vida, de ter sido resgatado
por ela.
“Tudo o que existe saiu das entranhas da Minha misericórdia” - Que
revelação maravilhosa! Quem dera pudéssemos aprofundar cada dia mais
seu sentido, então nossa vida seria totalmente transformada. No início
do Evangelho de São João, encontramos essas palavras: “No princípio era o
Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. No princípio, ele
estava com Deus. Tudo foi feito por meio dele e sem ele nada foi feito
de tudo o que existe” (Jo 1,1-3). Veja que mistério mais lindo e
profundo: tudo o que existe nasceu da misericórdia de Deus. Olhe
para sua vida, para tudo o que existe ao seu redor, para tudo o que você
tem: tudo isso brotou do coração amoroso de Deus. Sim, pois se Deus não
precisa de nada, por ser plenitude em si mesmo, a obra da criação não é
questão de necessidade, mas de amor. Deus não precisava ter criado
nada, mas criou porque ama. E é o mesmo São João que dirá, em outra
passagem: “Deus é amor” (1Jo 4,8). E o que é o amor senão a mesma
misericórdia divina? Precisamos entender bem a palavra misericórdia. Ela
é formada por duas palavras latinas: “miser”- que significa pobreza,
indigência, miséria; e por “cordis”- que quer dizer coração. Então, o
que significa misericórdia? Significa abrir o coração para a miséria do
outro. É o que Deus faz quando se inclina sobre nós. O que há em nós
senão miséria? E o que há em Deus senão amor? É na experiência da
misericórdia de Deus, portanto, que se dá a profunda realidade do
encontro entre a nossa humanidade, que é miséria, e a grandeza de Deus,
que é amor. A miséria é propriedade humana, em Deus não há miséria,
seria uma contradição. O amor, por sua vez, é propriedade de Deus: em
nós, por nossas próprias forças, não há amor, mas egoísmo, fruto do
pecado. Quando existem em nós manifestações de amor, isso já é fruto da
graça de Deus, como completa São João: “Pois o amor é de Deus e todo
aquele que ama nasceu de Deus” (1Jo 4,7).
“Toda alma contemplará em relação a Mim, por toda a eternidade, todo o Meu amor e a Minha misericórdia” - Contemplar
significa ver com os olhos do coração. Quando estivermos do outro lado
da montanha da vida, na eternidade, o que vamos contemplar em Jesus? Sua
grandiosidade e onipotência, seu poder e sua glória? Assim pensamos
nós. Mas, o que afirma Jesus é que vamos contemplá-lo por aquilo que lhe
é mais peculiar: a sua misericórdia. Veja que é isso que Jesus mais
prioriza e é assim que Ele quer que o vejamos. As pessoas gostam de
serem vistas por aquilo que são, ou que parecem ser, o que é pior. Jesus
não quer que o vejamos desse modo, com os olhos humanos, que não sabem
direito o que é mais importante para ser visto. Ele quer que o vejamos
justamente por aquilo que é a maior de suas qualidades, o maior de seus
atributos: a misericórdia! Que outro “deus”, concebido pelos homens, se
distingue pela misericórdia? E mesmo o verdadeiro Deus poderia
distinguir-se pela sua grandeza e poder, pela sua majestade, mas
preferiu distinguir-se pelo amor e pela compaixão. Esse é o grande
mistério que une o céu à terra.
“A Festa da Misericórdia saiu das Minhas entranhas” - Para
a pessoa humana, as entranhas têm um significado especial: trata-se
daquilo que vem do mais profundo do ser. É das entranhas da mãe que
nasce o filho. Tudo o que é mais forte em nossa vida, nós sentimos nas
entranhas. Você já percebeu que uma emoção forte como o medo ou a
felicidade mexem com o nosso estômago e a nossa barriga? É porque as
emoções são forças que vêm lá de dentro, de nossas profundezas, de
nossas raízes. Isso nos ajuda a compreender a afirmação de Jesus que diz
“A Festa da Misericórdia saiu das Minhas entranhas”, isto é, do mais
profundo de seu ser, das suas raízes, do seu íntimo. Não é algo
superficial, como um simples anseio, mas um desejo profundo, algo que
tem que ver com o próprio ser. Veja, querido(a) leitor(a), o quanto
Jesus valoriza essa Festa. Como deve ser grande todo o rio de graças que
Ele tem para nós, quando celebramos esse dia!
“Desejo que seja celebrada solenemente no primeiro domingo depois da Páscoa” - A
escolha do primeiro Domingo depois da Páscoa para a Festa da
Misericórdia tem um profundo sentido teológico e espiritual. Revela-se
assim a união profunda que existe entre o “mistério pascal da Redenção” e
o “mistério da Misericórdia de Deus”. Esta união está ainda sublinhada
pela Novena, com o Terço da Misericórdia Divina, começando na
Sexta-Feira Santa. Ao escolher esta data para a Festa, Jesus quer
mostrar que sua paixão, morte e ressurreição culminam na celebração da
sua infinita misericórdia. Trata-se de uma mesma realidade, de um mesmo
amor, de uma mesma entrega da sua vida em resgate da humanidade. É por
isso que no prefácio da Oração Eucarística número VII, a Igreja reza:
“Vós, Deus de ternura e de bondade, nunca Vos cansais de nos perdoar”. E
repete-se o refrão: “Como é grande, ó Pai, a Vossa Misericórdia!”.
“A humanidade não terá paz enquanto não se voltar à fonte da Minha misericórdia” - Por
fim, Jesus faz essa declaração que nos deixa ainda mais surpresos. O
desejo de paz, tão forte no coração de todas as pessoas, sobretudo nesse
período da história humana em que tantos conflitos armados e tanta
violência assolam o nosso planeta, só será plenamente satisfeito quando
nós nos voltarmos à fonte da Misericórdia Divina. Não há outro caminho
para a paz. Os homens tentam construir a paz sem Deus, nós também
tentamos às vezes construir nossa vida sem Deus, mas assim nunca
chegaremos à verdadeira paz. No Evangelho de São João, lemos:
“Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como o mundo dá”
(Jo 14,27). E ainda, depois da ressurreição, Jesus aparece aos
discípulos, escondidos no cenáculo, e lhes diz duas vezes: “Paz a vós”
(Jo 20, 19-20). A Misericórdia Divina é o verdadeiro caminho para a paz.
Caro
leitor(a), como eu disse no início, este artigo não encerra o assunto,
mas é apenas um convite para você aprofundar dia-a-dia a mensagem
apresentada. Que Jesus Misericordioso nos ajude a compreender o sentido
profundo da Festa da Misericórdia e a viver cada dia mais à sombra do
seu amor!
Pe. Ednilson de Jesus, MIC
Pároco e Reitor do Santuário da Divina Misericórdia
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